domingo, 10 de julho de 2011

Vingança

- “Corre, Darn! Foge!”
O pânico gritava por toda a aldeia enquanto esta ardia. Mães desorientadas mandavam os filhos para os montes circundantes. Homens de família e jovens que já atingiram a idade adulta, corriam de um lado para o outro, carregando baldes e barris cheios de água, criando várias poças com o que se entornava.
Telhados sucumbiam às chamas que deflagravam na zona sul. Bandidos brandiam machados e espadas enquanto pilhavam as casas, matavam os homens e raptavam as mulheres.
- “Não percas tempo! FOGE! Irá haver altura para a justiça. – “Disse, observando a expressão de resignação na face do seu filho. – “Desta vez terás que partir com os outros. Cuida deles … ” – Terminou com um murmúrio.
Contrafeito, Darn virou costas à sua aldeia, à sua casa, à sua familia, e dirigiu-se subiu o monte em direcção a norte, para uma pequena floresta que lá crescera. Um último olhar para trás tirou-lhe o resto das forças.
A maior parte das casas era agora um monte de cinzas e vigas negras, enquanto que as poucas que restavam ardiam violentamente. A estalagem de dois andares, orgulho da comunidade, desaparecera. Só se via as fundações e parte dos estábulos. Quanto à sua casa, não estava à vista. A coluna de fumo que se elevava escondia grande parte da aldeia.
Forçou-se a penetrar a floresta, e uma vez em segurança, perto de um rochedo, longe da aldeia, Darn entregou-se ao cansaço e adormeceu.
***
- “Posso conceder-te a tua vingança.” – Disse uma voz.
Darn abriu os olhos. Estava sozinho numa escuridão impenetrável.
- “Quem está ai?”
A resposta veio sob a forma de luz. Perto dele, uma área pequena iluminou-se. De onde vinha a luz, Darn não conseguiu perceber. “Não passa de um sonho.” - convenceu-se, avançando para a luz.
- “Oh, mas é mais que um sonho, rapaz.”
- “MOSTRA-TE!” – O medo ameaçava tomar conta dele.
Materializou-se então, à sua frente, a figura de um homem velho. Vestia um manto que o cobria totalmente. Uma barba, quase tão longa, branca como a neve, pendia à sua frente.
- “Posso conceder-te a tua vingança.”
- “Quem és tu?”
- “Quem eu sou, não irias compreender… Pertenço ao passado, ao futuro. Ao tempo e à mente. Chama-me Nash, pois é assim que me chamam desde a alvorada do Primeiro.”
Darn observou-o durante uns breves segundos. O homem era fascinante. Intrigava-o.
- “Que sabes tu sobre a minha vingança?”
- “Sei que a tua aldeia foi devastada. Pilhada por bandidos sedentos de sangue e dinheiro. Escolhe o teu caminho, Darn, pois as mulheres sofrem destino pior.”
Darn acenou em compreensão.
- “Muito bem. Pega nesta pedra.” – Disse, entregando-lhe um pequeno seixo vermelho polido. – “Quando tiveres preparado, aponta-a para o sol do meio-dia. Se mudares de ideias, não poderás voltar atrás.”
Darn acenou de novo.
- “Agora acorda e segue o teu caminho.”
***
- “Espere-Espere-Espere…”
Estava de novo na floresta. O silêncio reinava ali. Corria uma brisa fresca, trazendo consigo o cheiro a madeira e carne queimada. Decidiu voltar à aldeia. Talvez os sobreviventes já tivessem voltado. Desconhecia quanto tempo estivera deitado.
A encosta era grande, mas depressa chegou ao sopé da monte. O caos e a destruição reinavam para onde quer que olhasse. Tinha que fazer algo. Estava na altura de… Justiça!
Erguendo a pedra (agora tinha a certeza que não tinha sido um sonho), olhou através dela para o Sol. O que o viu deixou-o maravilhado. Era o mesmo espaço, num mundo novo. Sentiu um calor percorrê-lo lentamente. E algo mais a fluir juntamente. A sua ânsia de vingança crescia dentro dele. Fechando os olhos viu uma fonte luminosa cheia de um liquido cor de âmbar.
“Isto é a tua vingança.” – Ouviu murmurar algures na sua cabeça.
Sentia o liquido a consumir o seu ser. Não tinha muito tempo. Procurando o trilho deixado pelos bandidos, Darn seguiu para sul, em direcção ao rio. Não tardou a avistar uma grande casa senhorial degradada. Fumo saía em espirais por uma pequena chaminé. Ali estavam eles.
Caminhou em silêncio. Um portão partido e fora dos gonzos, tentava impedir a entrada num jardim seco e repleto de plantas selvagens. De repente ouviu uma mulher gritar dentro da casa. Uma raiva incontrolável cresceu dentro dele e a fonte jorrou o liquido. Sentia cada fibra do seu corpo a vibrar, estava cheio de um poder imparável. Aproximando-se da porta, rebentou com a mesma. Estilhaços de madeira voaram em todas as direcções.
Alguns bandidos, perplexos olharam-no nos olhos. Estes eram agora de um branco leitoso, tal como a aura que o envolvia.
- “Mas que–” – Inquiriram confusos.
- “Pilharam a aldeia.” – Avançou na sua direcção. – “Queimaram as nossas casas. ” – Continuou – “Mataram os nossos pais e irmãos.” – Estava agora a escassos metros. – “Levaram as nossas mulheres.”
E então os homens incendiaram-se. A dor sentida era insuportável. Enquanto uns eram reduzidos a cinzas, a outros era arrancada a pele por mãos invisíveis. Sangue enchia o chão de mármore e salpicava as paredes. Os gritos despertaram os restantes, que se encontravam noutras divisões. Eram mais, mas não importava, todos iam pagar.
O terror prendia as mulheres a um canto, enquanto observavam fascinadas as mortes dos seus raptores. Um espectáculo terrível de se ver, mas menos doloroso que o tratamento dos bandidos.
A fonte continuou a enchê-lo daquela doce sensação. Era insaciável e, no entanto, estava a matá-lo.
- “Fujam. Desta vez, eu fico.”
As mulheres obedeceram. Darn encarou os corpos mutilados e irreconhecíveis dos seus adversários. Tinha terminado. Fechando os olhos, absorveu as últimas golfadas da fonte e, explodiu.

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