domingo, 10 de julho de 2011

O fim

“Pensava que a minha única paixão era a espada. Como um tolo, servia o meu senhor. Mas eu era bom, inigualável, uma fonte de medo e respeito.”
Um movimento rápido e o último dos guardas da ponte, caía por terra, sem vida. Limpando a lâmina às vestes, voltou a embainhá-la. A lua estava escondida. A traição também não lhe agradava.
“Mas depois tu apareceste. Deslumbrante, poderosa, arrebatadora, qual raio de Sol numa quente manhã de Verão, depois de uma longe noite de batalha.”
Com a cautela a marcas os seus passos, avançou para o pátio principal. Não havia guardas. Claro que não havia guardas. Fora cuidadoso e conhecia bem a casa e o recheio.
“E eu larguei a espada. Havia uma nova paixão, uma nova força que requeria toda a minha atenção. E eu dei-ta. Era teu e tu minha.”
Uma vez dentro da fortificação, reparou que os corredores estavam vazios, iluminados apenas pela luz dançante das velas nas paredes. Algo estava errado. Era noite, mas e os guardas? Ou o ocasional criado a deambular por aqueles corredores? Decidiu prosseguir, com uma atenção redobrada.
“E então eles levaram. Os meus dois maiores tesouros, a minha vida, a minha família.”
O ambiente manteve-se inalterado até atingir o segundo piso. Aqui havia um som diferente. O som de botas fazia-se ouvir pelo corredor, um eco, e estava a aproximar-se.
Desembainhando a espada, aguardou, pacientente, a chegada do estranho. O som de corrida tornou-se cada vez mais perceptível, até estar mesmo em cima dele.
- “Alto!” – Pronunciou numa voz trovejante.
O criado, que estava a apenas cinco passos dele, assustou-se, tropeçando, caindo num emaranhado de vestes, tapete e um conjunto de chá de prata, agora vazio.
- “M-M-Meu senhor, em que posso ser útil?” – Gagejou, levantando-se ainda assustado e embaraçado, apanhando a loiça caida.
- “De onde vens? Quem quereria chá tão tarde?”
- “Senhor?” – Inquiriu confuso a meio caminho das chávenas.
- “Onde está Richard?”
Sem pronunciar uma palavra, o criado apontou para o piso superior, onde se encontrava o Grande Salão.
- “Vai procurar um novo senhor para servires.” – Disse, atirando um bolsa cheia de moedas de ouro. Era tudo o que possuía, e seria suficiente.
Agradecendo, o criado largou a prata, provocando novo estrondo, e retomou a corrida, agora livre.
“Agora resta-me apenas a minha vingança, e a minha velha paixão pela espada.”
Com um suspiro, partiu para o Salão. Não demorou muito a chegar à porta pois, mais uma vez, não encontrou nada, a não ser corredores vazios. Contudo, uma vez no corredor final, avistou as grandes portas castanhas, ladeadas por guardas em armadura.
***
Dentro do Salão, Richard dormitava enquanto a sua guarda, composta por todos os soldados que não se encontravam nas muralhas, conversava entre si, dividios em grupos pela divisão. A grande lareira, bem como as velas, encontravam-se a arder, com um fogo alegre.
- “Talvez ele não venha de todo.” – Ouviu um dizer. – “Ou então nem tenha conseguido passar as muralhas.” – Dissera outro.
Mas ele sabia que não assim. Sabia que Davo não era um soldado qualquer. Era um mestre na arte da espada, e uma pessoa com uma grande capacidade na arte da guerra. Oh, ele iria chegar sem dúvida alguma. A questão era, por onde iria entrar. Mas não iria longe. Não com a sua guarda em peso nesta sala.
De repente, um novo som juntou-se à confusão dentro do Salão. Vinha do corredor. Era uma mistura de gritos com o choque metálico de armas e armaduras. Com as portas fechadas, era impossível saber mais.
Esse pensamento, porém, pareceu ter percorrido a mente de todos os presentes, pois assumiram posições de combate e alguém ordenou que fossem ver o que se passava. Um tanto ensonado, Richard observou o soldado. “Pobre infeliz.” Quando esticou a mão para abrir as portas, estas saltaram dos gonzos, projectando o soldado, vários fragmentos de madeira e um corpo, pelo Salão.
Acompanhando a explosão, veio um rugido que o despertou – “RICHARD!”
De pé, no lugar onde estiveram as duas portas, encontrava-se o seu melhor soldado, agora um inimigo.
***
Davo prescrutou a sala, com um olhar rápido, prendendo-se na figura sentada numa cadeira de costas altas. Ali estava o homem responsável.
“Sarah, Demodred. Está quase no fim.”
A perplexidade depressa desapareceu nos guardas, dando lugar à coragem, e investiram. Um a um, foram caindo, pois ninguém sabia aquela dança. Mortal, rápida, imparável. Desferia os golpes, outra e outra vez, uns atrás dos outros, parando apenas para remover a sua espada de um qualquer corpo inanimado.
No entanto, ele era só um e, quando saltou para cima de Richard, derrubando-o, já levava vários golpes fundos no corpo, bem como um braço inutilizável.
- “Porquê?”
- “Porque sim.” – Riu-se. – “Eram traidores, todos eles. Conspiravam contra mim, sabias?”
- “Era o meu filho!” – Trovejou.
- “Oh sim, o pequeno.” – Disse com um sorriso maldoso. – “Eu queria-te de volta. Este é o teu mundo, não aquele. Este é o teu verdadeiro lugar, a meu lado.”
- “Servi-te durante muito tempo. Trouxe-te glória e prosperidade e em troca, recebi uma familia. Mas tu… Tu roubaste a minha vida. Levaste-a sem razão e agora, eu levo a tua.”
Dito isto, desferiu o golpe que acabaria com o seu sofrimento. Sangue jorrou do peito de Richard, bem como de Davo. Ambos partilhavam a vida.
- “Acabou.” – Murmurou. – “Finalmente posso partir… E ficar onde pertenço, a teu lado… Sarah.”

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